Na sua edição 2025, o Balanço Energético Nacional (BEN), elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) em parceria com o Ministério de Minas e Energia (MME), considerou pela primeira vez o consumo de eletricidade por veículos no transporte rodoviário. Isso foi feito retroativamente, pegando os números desde 2020, e fechando em 2024.
Com isso, alguns números foram levantados sobre as mudanças no perfil de consumo. O número de veículos elétricos em 2020 era de 1,9 mil, e passou a 215 mil em 2024.
É um aumento de 100 vezes, e ainda assim um número bem menor do que o mais recente encontrado pela empresa Neocharge a partir de dados da Senatran. Segundo esses números, há mais de meio milhão de eletrificados em circulação no Brasil. Desses, 286 mil são elétricos a bateria (BEV) ou plug-ins híbridos (PHEV) – os únicos considerados pelo EPE, porque, para o estudo, só faz sentido contar os veículos que carregam na tomada.
Balde d’água no oceano
Outro número importante no Balanço é o aumento no consumo de energia no transporte. Ele foi de 14 gigawatts-hora (GWh) em 2020 para 309 GWh em 2024. Um aumento de 2000% – ou 20 vezes, como foi noticiado em outros veículos.
Pode soar alarmante, mas números sem uma base de comparação podem levar a conclusões equivocadas. Então vamos trazer alguns outros números para explicar o que esses 309 GWh significam.
Nos EUA, em 2023, o consumo por veículos elétricos ficou em 7.596 GWh – mais de 20 vezes o do Brasil no ano seguinte. Segundo o Boletim do Sistema Elétrico Brasileiro, o Brasil produziu 687.692 GWh de energia em 2024. Isso significa que os 309 GWh consumidos por EVs são 0,05% da produção elétrica nacional.
Dito de outra forma: a cada 2 mil unidades de energia elétrica geradas no Brasil em 2024, uma foi para o transporte. A usina de Itaipu sozinha, que gerou 67.088 GWh ano passado, daria conta de 200 vezes o consumo anual de eletricidade por veículos elétricos.
Mas e se todos os veículos fossem elétricos?
Uma razão para o número ser tão modesto é que a frota eletrificada no Brasil ainda é minúscula. Segundo dados da Senatran, o Brasil tinha 124 milhões de veículos ao final de 2024. Os 296 mil elétricos atuais correspondem assim a 0.24% do total da frota. Menos que 1 em 400 veículos.
Para chegar próximo do total atual da frota, o número de EVs teria que aumentar mais de 400 vezes. E, se o consumo aumentasse na mesma proporção, teríamos 20% da produção elétrica absorvida pelo transporte.
É um número bem mais vultoso. Mas o cálculo é grosseiro, tratando praticamente todos os veículos como carros. Eles são a grande maioria dos elétricos atualmente (90% nos números do BEN), mas são apenas 50% da frota total. Motos, o segundo veículo mais comum, consomem bem menos. E veículos de transporte, bem mais.
Ainda assim, tomando esses 20% como uma estimativa aproximada, podemos ver que a produção de energia brasileira cresceu 23% nos últimos 10 anos. E ninguém prevê que 100% da frota brasileira será elétrica em apenas 10 anos – muito pelo contrário, a consultoria McKinsey, para ficar só num exemplo, falou em 20% em 15 anos. Mesmo na Noruega, que atualmente vende quase 100% de elétricos, 70% da frota ainda é a combustão interna.
Os números mostram que o caminho ainda é longo, mas está longe de ser inviável. O BEN ainda indica que 91% da produção elétrica brasileira é de fontes renováveis. Instituições como o ICCT consideram como um diferencial altamente positivo do Brasil em favor da eletrificação.